- Sempre gostei de ver a água escorrendo pelo ralo.
- Que loco isso!
- Coisa de criança... ficar olhando a água escorrer para o fundo do ralo, mas eu sempre gostei.
Uma rosa e uma embalagem de chocolate sobre a cabeceira.
- Uma vez me disseram que “ quando uma garota estiver triste, vá em seu encontro mas leve chocolates!”
- Hahaha! Você é demais!
Eu ainda deitado na cama. Agora estou em decúbito dorsal. A gaveta das meias está entreaberta.
- Também não está na gaveta!
- Onde foi que eu coloquei o meu canivete?!
- Você já olhou na “farmacinha” do banheiro?
Estou deitado nessa cama acho que faz três dias. Uma formiga caminha solitária pela parede. Ela se aproxima do relógio.
- Não é bonito?! Achei legal e comprei.
- É lindo agora vem pra cá ! Deita aqui !
- Ele vai impedir que o tempo faça você me esquecer!
- Claro querida, você está certa! Você tem sempre razão! Agora... deita aqui!
- Você está me ouvindo?!
Eu acho que nunca entendi você direito. Você deitada, dormindo. Eu sempre achei tão bonito seu rosto enquanto você dormia. Apesar de todas as pessoas que deram tapinhas em meu ombro, me desejando força ; apesar de todas as senhoras chorosas que babavam o meu ombro ao me abraçar resmungando palavras de consolo incompreensíveis; apesar disso eu continuava a te admirar dormindo. Demorei pra entender que você tinha morrido. Te olhava e pensava “linda”.
- Lógico que sou linda!
- Hahahaha! Humildade sempre foi seu forte!
- Ai! Me larga! Hahai !
- Hum...!
- Ei !
- Hum... oi!
- Você gostou do relógio?! Ele ficou bem ali?!
- Lógico! Você tem sempre razão!
- Bobo!
O relógio parou desde que você morreu. Os seus ponteiros parados me revelam algo! Estou deitado nessa cama a três dias, três anos ou três meses. Agora não importa mais, a formiga já invadiu o relógio. Você tinha razão o canivete estava na “farmacinha” do banheiro. Sempre gostei de ver a água escorrer para o fundo do ralo. O relógio marca três horas e a formiga o contempla catatônica. A água escorre para o fundo do ralo. Nem todo chocolate do mundo é suficiente para formiga agora. A água escorre para o ralo. Nada importa, a formiga agora tem o tempo e ele está parado. Ela então começa a entendê-lo. Eu começo a perceber que a algo novo na água. Algo novo desce para o ralo. Você tinha razão, agora eu entendo. O relógio impediu o tempo. É o tempo. È a formiga. Sou eu. É o sangue que desce para o ralo.
Sinto-me fraco, estou desmaiando. Na parede a formiga se funde com o relógio e vence o tempo para sempre. Você tinha razão, eu nunca vou te esquecer!
José Roberto Pereira Leite Filho
20/12/06
***
Quem arrumar um título pro conto ganha uma bala de fuzil caramelada!
5 comentários:
"Salvem ele Dalí", pode ser, ou já ouvimos antes? Hehehe
Tá show seus escritos!
:)
"O ralo, o relógio, a formiga... Cadê meu canivete?"
Você tem futuro hein, rapaz? Quero crescer e fazer inveja ao povo dizendo: Eu estudei com Roberto Leite. hehehe
Dali deve estar se remexendo na cova porque você não deu o crédito do quadro dele! kkkkkk
ATUALIZA!
:)
amei
não gostei da parte da morte achei um peso desnecessário
essa parte mais leve eh o que há
preferia que fosse uma partida
uma quebra sem motivos dos sentimentos
daria no mesmo
um tipo de morte menos mórbid...
parabéns pelo texto.
Postar um comentário